Poderá também gostar:

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...

sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

Ateus estão zangados com Deus.

Por Joe Carter
Já agitei o meu punho contra carros que não pegavam, contra nuvens de chuva, e  contra  metereólogos incompetentes. Até já cheguei a amaldiçoar, no mesmo dia, um alternador avariado, uma sirene barulhenta e uma previsão do tempo totalmente errada. Já me zanguei com os móveis, já maldisse guardas com quem me cruzei, e até já fiquei zangado com a Gun Barrel City, Texas. Basicamente, eu já fiquei zangado com quase tudo o que podem imaginar.
Excepto unicórnios. Eu nunca fiquei zangado com unicórnios.
É bem provável que vocês também nunca tenham estado zangados com unicórnios. É possível nós ficarmos nervosos com objectos e com criaturas com e sem vida. De certa forma, nós podemos até ficar incomodados com personagens fantasiosas de livros e de sonhos. Mas criaturas tais como os unicórnios, criaturas que nós realmente acreditamos que não existem, tendem a não nos enervar. Certamente que não culpamos aos animais com um corno pelos nossos problemas.
O único grupo social que é excepcional em relação a esta regra são os ateus. Eles alegam acreditar que Deus não existe mas no entanto, e levando em conta estudos empíricos, tendem a ser as pessoas que mais zangadas estão com Deus.
Uma nova gama de estudos do "Journal of Personality and Social Psychology" apurou que os ateus e os agnósticos evidenciaram raiva contra Deus, quer seja no passado, quer seja quando eles se focaram numa imagem hipotética do que eles imaginam como Deus deve ser.
Julie_ExlineJulie Exline, psicóloga na  Universidade Case Western Reserve e autora principal deste estudo mais recente, examinou outros dados em torno deste assunto e os mesmos geraram os mesmos resultados.
Exline explica que o seu interesse foi inicialmente despertado quando um estudo prévio em torno da raiva contra Deus reportou um dado contra-intuitivo: aqueles que reportaram não ter fé em Deus tinham mais ressentimento contra Ele do que os crentes.
À primeira vista, este dado parece reflectir um erro: como é que as pessoas podem ter raiva de Deus se elas não acreditam que Ele existe? Análises posteriores levadas a cabo com outro conjunto de dados revelou padrões semelhantes. Aqueles que, em relação à crença religiosa, se classificaram como "ateus/agnósticos" ou "nenhuma/incerto", reportaram mais raiva contra Deus do que aqueles que reportaram afilicação religiosa.
Exline nota que estes estudos levanta a questão se por acaso a raiva pode influenciar a crença na existência de Deus, uma ideia consistente com dados prévios extraídos das ciências sociais relativas ao "ateísmo emocional."
Estudo de eventos traumáticos sugerem a possibilidade de existir uma ligação entre o sofrimento, a raiva contra Deus, e dúvidas em relação à Sua existência. Segundo Cook e Wimberly (1983), 33% dos pais que sofreram a morte dum filho reportaram dúvidas em relação a Deus no primeiro ano da sua perda.
Noutro estudo, 90% das mães que haviam tido um filho com problemas profundos de deficiência cognitiva vocalizaram dúvidas em relação à existência de Deus (Childs, 1985). A nossa pesquisa levada a cabo junto de estudantes universitários focou-se directamente na associação entre a raiva contra Deus e a auto-reportada queda na crença (Exline et al., 2004). Depois de se atravessarem momentos negativos na vida, a raiva contra Deus pavimentou o caminho para uma redução na crença na existência de Deus.
O dado mais surpreendente foi o que quando Exline analisou as pessoas que reportaram uma queda na crença religiosa, a sua fé era menos susceptível de ser recuperada se a raiva contra Deus havia sido a causa da perda da fé. Dito de outra forma, a raiva contra Deus não só leva as pessoas ao ateísmo, como lhes dá um motivo para se agarrarem à descrença.
Eu já avancei, em outros lugares, que, segundo a tradição Cristã, o ateísmo é uma forma auto-imposta de disfunção intelectual, uma falta de virtude epistémica, ou (para usar um termo usado pelos meus amigos Católicos) um caso de ignorância vencível.
A ignorância vencível é a supressão intencional de conhecimento que está dentro da área de controle da pessoa e que, como consequência do qual, ela responde perante Deus. Em Romanos, São Paulo é claro ao afirmar que o ateísmo é um caso de ignorância vencível:
Porque as Suas coisas invisíveis, desde a criação do mundo, tanto o Seu eterno Poder, como a Sua Divindade, se entendem, e claramente se vêem, pelas coisas que estão criadas, para que eles fiquem inexcusáveis. Romanos 1:20
Aceitar a existência de Deus é apenas o princípio: nós temos também que reconhecer vários dos Seus Atributos Divinos. Os ateus que negam isto estão, tal como disse São Paulo, inexcusáveis. Eles estão vincivelmente ignorantes.
No entanto, mesmo que reconheçamos este facto, isto não significa que a causa da disfunção auto-imposta esteja entendida.
Embora eu acredite firmemente que todas as formas de ateísmo são casos tanto de ignorância vencível como de obstinação da vontade, eu por vezes assumi, erradamente, que isso era puramente intelectual - um assunto da mente e não do coração. Só mais recentemente é que comecei a analisar como muita da resposta à dor e ao sofrimento podem empurrar a pessoa para a visão do mundo ateísta.
Muitos pastores e padres olharão para a minha epifania como um pensamento óbvio e tardio, mas eu tenho a suspeição de que não sou o único apologista amador que se encontrava cego perante esta verdade. Como regra geral, nós que nos encontramos na apologética Cristã preferimos o filosófico e não o pastoral, a estrutura sólida dos argumentos lógicos em vez da emoção humana.
É frequente nós preferirmos a resposta perspicaz (que invalida o problema do mal) do que a empatia paciente (que consola os ateus e lhes mostra que também nós estamos perplexos com o sofrimento).
Jesus_HugClaro que muitos ateus procedem negando a existência de Deus tendo como base apenas as justificações racionais. E é por isso que as abordagens evidencialistas e filosóficas serão sempre necessárias. Mas começo a suspeitar que o ateísmo emocional seja muito mais comum do que muitas pessoas pensam.
Precisamos duma nova abordagem apologética que leva em conta que a dor comum bem como os sofrimentos da vida afastam mais as pessoas de Deus do que livrarias cheias de livros anti-teístas. Ao só nos focarmos nas palavras enfurecidas dos Novos Ateus podemos  ficar cegos em relação à raiva e ao sofrimento que está a acrescentar mais descrentes às suas fileiras.
* * * * * * *
A raiva é um veneno tão poderoso que pode afastar a criatura do Seu Criador, e fazer com que ela passe toda a eternidade arrependida. Por isso é que em Hebreus 12:15 o Espírito Santo ordena:
Tendo cuidado de que ninguém se prive da graça de Deus, e de que nenhuma raiz de amargura, brotando, vos perturbe, e por ela muitos se contaminem.
Estes estudos científicos confirmam o que muitos apologistas já tinham notado: os argumentos da militância ateísta contra Deus são, essencialmente, argumentos emotivos e não argumentos que têm uma base racional e empírica.
Fontes:
1. Dr. Sanjay Gupta, “ Anger at God common, even among atheists - http://cnn.it/1Oshkbb
2. Julie Juola Exline and Alyce Martin, ” Anger Toward God: New Frontier in Forgiveness Research - http://bit.ly/1RipEuF
3. Joe Carter, Do Tummy Aches Disprove God? - http://bit.ly/1IKDO6J

quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Os Filósofos de Deus e o mito da "Idade das Trevas"

Por Tim O'Neill
O meu interesse pela ciência Medieval foi largamente estimulado por um livro. Por volta de 1991, quando eu era um aluno de pós-graduação empobrecido e frequentemente esfomeado na Universidade da Tasmânia, dei com uma cópia do livro de Robert T. Gunther com o título de "Astrolabes of the World" - 598 páginas-fólio de astrolábios islâmicos, Medievais e Renascentistas meticulosamente catalogados, cheio de fotos, diagramas e listas estreladas, bem como uma vasta gama de outro tipo de informação.
Dei com ele, e de forma bem apropriada e não incidental, nos "Astrolabe Books" de Michael Sprod - no piso de cima de um dos lindos e antigos armazéns de arenito que se encontram alinhados num lugar com o nome de "Salamanca Place" (...). Infelizmente, o livro custava $200, o que por aquela altura era o equivalente ao que eu tinha para gastar durante o mês inteiro.
Mas o Michael já estava habituado a vender livros a estudantes empobrecidos, e devido a isso, não almocei e fiz um adiantamento de $10 e, durante vários meses, regressava todas as semanas para dar o mais que podia até que eventualmente consegui levá-lo para casa, embrulhado em papel castanho duma forma que só as livrarias Hobart se preocupam em fazer. Há poucos prazeres mais gratificantes do que aquele em que se tem nas mãos o livro que há já muito tempo se quer ler.
Filosofos_de_Deus_Gods_PhilosophersTive outra experiência igualmente gratificante quando, há algumas semanas atrás, recebi uma cópia do livro de James Hannam com o título de "God's Philosophers: How the Medieval World Laid the Foundations of Modern Science" ["Os Filósofos de Deus: Como o Mundo Medieval Estabeleceu os Fundamentos da Ciência Moderna"].
Há já alguns anos que brinco com a ideia de criar um site dedicado à ciência e à tecnologia Medieval como forma de tornar públicas as mais recentes pesquisas em torno do tópico, e também para refutar os mitos preconceituosos que caracterizam esse período como uma Idade das Trevas repleta de superstição irracional. Felizmente, hoje posso riscar essa tarefa da minha lista porque o suberbo livro de Hannam fez esse trabalho por mim, e em grande estilo.
A Idade das Trevas Cristã e Outros Mitos Histéricos
Um do riscos ocupacionais de se ser um ateu e um humanista secular que divaga por fórums de discussão é o de encontrar níveis assombrosos de ignorância histórica. Gosto de me consolar com a ideia de que muitas das pessoas que se encontram em tais fórums adoptaram o ateísmo através do estudo da ciência, e como tal, mesmo que essas pessoas tenham conhecimentos avançados em áreas tais como a geologia e a biologia, o seu conhecimento histórico encontra-se parado no nível secundário. Geralmente, eu costumo agir assim porque a alternativa é admitir que o entendimento histórico médio da pessoa comum, e a forma como a História é estudada, é tão frágil que se torna deprimente.
Logo, para além de ventilações regulares de mitos cabeludos tais como o da Bíblia ter sido organizada no Concílio de Niceia, ou do enfadonho disparate cibernético de que "Jesus nunca existiu!", ou também do facto de pessoas inteligentes estarem a propagar alegações pseudo-históricas que fariam com que até Dan Brown suspirasse com escárnio, o mito de que a Igreja Católica causou a Idade das Trevas, e que o Período Medieval foi um vazio científico, é regularmente empurrado com um carrinho-de-mão ferrugento para a linha da frente como forma de o expor por toda a arena.
O mito diz que os Gregos e os Romanos eram sábios e pessoas racionais que amavam a ciência, e que estavam à beira de fazer todo o tipo de coisas maravilhosas (normalmente, a invenção de máquinas a vapor de grande porte é inocentemente invocada) até que o Cristianismo chegou. O Cristianismo baniu, então, todo o conhecimento e todo o pensamento racional, e inaugurou a Idade ds Trevas.
Durante este periodo, diz o mito, a teocracia com punho de ferro, apoiada pela Inquisição ao estilo da Gestapo, impediu que fosse feita qualquer actividade científica, ou qualquer actividade de investigação, até que Leonardo da Vinci inventou a inteligência e o Renascimento nos salvou a todos das trevas Medievais.
As manifestações cibernéticas desta ideia curiosamente pitoresca, mas aparentemente infatigável, variam de quase atabalhoadas a totalmente chocantes, mas a ideia continua a ser uma daquelas coisas que "toda a gente sabe", e que permeia a cultura moderna.
Um episódio recente da série "Family Guy" exibiu o Stewie e o Brian a entrar num mundo alternativo futurista onde, foi-nos dito, as coisas eram avançadas desse modo porque o Cristianismo não havia destruído o conhecimento, dado início à Idade das Trevas, e impedido o desenvolvimento da ciência. Os escritores não sentiram a necessidade de explicar o significado das palavras de Stewie porque assumiram que toda a gente sabia.
Cerca de uma vez a cada 3 ou 4 meses em fórums tais como RichardDawkins.Net temos algumas discussões onde sempre aparece alguém a invocar a "Tese do Conflicto". Isso evolui para o normal ritual onde a Idade Média é retratada como um deserto intelectual onde a humanidade se encontrava algemada pela superstição e oprimida pelos cacarejadores asseclas da Velha e Maligna Igreja Católica.
Os velhos estandartes são apresentados na altura certa: Giordano Bruno é apresentado como um mártir da ciência, nobre e sábio, e não como o irritante místico "Nova Era" que ele era. Hipatia é apresentada como outra mártir deste tipo, e a mitológica destruição da Grande Biblioteca de Alexandria é falada num tom silencioso, apesar de ambas estas ideias serem totalmente falsas.
O incidente em torno de Galileu é apresentado como evidência dum cientista destemido a opor-se ao obscurantismo científico da Igreja, apesar do incidente ter tanto a ver com a ciência como com as Escrituras. E, como é normal, aparece sempre alguém a exibir um gráfico (ver mais embaixo), que eu dei o nome de "A Coisa Mais Errada de Sempre da Internet", e a mostrá-lo triunfalmente como se o mesmo fosse prova de algo que não do facto da maior parte das pessoas serem totalmente ignorantes da História, e incapazes de ver que algo como "Avanço Científico" nunca pode ser quantificado, e muito menos pode ser representado visualmente num gráfico.
Ciencia_Idade_Media_Segundo_Os_Ignorantes
Não é difícil pontapear este disparate e reduzi-lo a nada, especialmente porque as pessoas que o apresentam não só não sabem quase nada de História, como também tudo o que fazem é repetir ideias estranhas como esta que eles viram em sites e livros populares. Estas alegações entram em colapso mal tu as atacas com evidências sólidas.
Eu gosto de embaraçar por completo estes propagadores perguntando-lhes que me apresentem um - um só - cientista que foi queimado, perseguido, ou oprimido durante a Idade Média por motivos científicos. Eles são incapazes de me apresentar um único nome. Normalmente, eles tentam forçar Galileu de volta à Idade Média, o que é engraçado visto que ele foi contemporâneo de Descartes.
Quando lhes é perguntado o porquê deles serem incapazes de apresentar um único nome dum cientista que tenha sofrido por motivos científicos, visto que aparentemente a Igreja esta ocupada a oprimi-los, eles normalmente alegam que a Velha e Maligna Igreja fez um trabalho tão bom a oprimi-los que todas as pessoas passaram a ter medo de fazer ciência.
Quando eu lhes apresento uma lista de cientistas da Idade Média - tais como Albertus MagnusRobert GrossetesteRoger BaconJohn Peckham, Duns ScotusThomas BradwardineWalter BurleyWilliam HeytesburyRichard SwinesheadJohn DumbletonRichard de WallingfordNicholas OresmeJean Buridan e Nicolau of Cusa - e lhes pergunto o porquê destes homens levarem a cabo a sua actividade científica durante a Idade Média alegremente e sem terem sofrido qualquer tipo de interferência por parte da Igreja, os meus adversários frequentemente coçam as cabeças confusos sobre o que foi que correu mal.
A Origem dos Mitos
A forma como os mitos que deram origem "A Coisa Mais Errada de Sempre da Internet" surgiram encontra-se bem documentada em vários livros em torno da história da ciência. Mas Hannam inteligentemente lida com eles nas páginas iniciais do seu livro visto que seria provável que eles viessem a formar uma base que levasse muitos leitores do público geral a olhar com suspeição para a ideia dos fundamentos Medievais da ciência moderna.
Uma melange purulenta envolvendo a intolerância do Iluminismo, os ataques anti-papistas feitos por Protestantes, o anti-clericalismo Francês, e a arrogância Classicista, levou a que o período Medieval ficasse caracterizado como uma era de atraso e superstição - o oposto do que a pessoa comum associa com a ciência e com a razão.
Hannam não só mostra como polemistas tais como Thomas HuxleyJohn William Draper, e Andrew Dickson White - todos eles com o seu preconceito anti-Cristão - conseguiram moldar a ainda presente ideia de que a Idade Média foi uma era vazia de ciência e de conhecimento racional, como revela que só quando historiadores no verdadeiro sentido do termo se incomodaram em colocar em causa os polemistas através das obras de pioneiros na área, tais como Pierre DuhemLynn Thorndike, e o autor do meu livro sobre o astrolábio,  Robert T. Gunther, que as distorções dos preconceituosos começaram a ser corrigidas através pesquisas fiáveis e vazias de preconceito .
Esse trabalho foi agora completado pela mais recente gama de modernos historiadores da ciência tais como David C. LindbergRonald Numbers, e Edward Grant. Na esfera académica pelo menos a "Tese do Conflicto" duma guerra histórica entre a ciência e a teologia há muito que foi colocada à parte.
É, portanto, estranho que tantos dos meus amigos ateus se agarrem de forma tão desesperada a uma posição há muito morta que só foi mantida por polemistas amadores do século 19, em vez de se agarrarem às  pesquisas apuradas levadas a cabo por historiadores objectivos e actuais, e que cujas obras foram alvo de revisão por pares. Este comportamento é estranho especialmente quando o mesmo é levado a cabo por pessoas que se intitulam de "racionalistas".
Falando em racionalismo, o ponto crucial que o mito obscurece é precisamente o quão racional a pesquisa intelectual foi durante a Idade Média. Embora escritores tais como Charles Freeman continuem a alegar que o Cristianismo matou o uso da razão, a realidade dos factos é que graças ao encorajamento de pessoas tais como Clemente de Alexandria e Agostinho em favor do uso da filosofia dos pagãos, e das traduções das obras de lógica de Aristóteles, e de outros feitas, por Boécio, a investigação racional foi uma das jóias intelectuais que sobreviveu ao colapso catastrófico do Império Romano do Ocidente, e foi preservada durante a assim-chamada Idade das Trevas.
O soberbo livro God and Reason in the Middle Ages de Edward Grant detalha precisamente isto com um vigor característico, mas nos seus primeiros 4 capítulos Hannam faz um bom resumo deste elemento-chave. O que torna a versão histórica de Hannam mais acessível do que a de Grant é que ele conta-a através das vidas das pessoas-chave da altura - Gerbert de Aurillac, Anselmo, Guilherme de Conches, Adelardo de Bath, etc.
Algumas das pessoas que fizeram uma avaliação [inglês: "review] do livro de Hannam qualificaram esta abordagem de um bocado confusa dado que o enorme volume de nomes e mini-biografias podem fazer com que as pessoas sintam que estão a aprender um bocado sobre um vasto número de pessoas. Mas dada amplitude do tópico de Hannam, isto é francamente inevitável e a abordagem semi-biográfica é claramente mais acessível que a pesada e abstracta análise da evolução do pensamento Medieval.
Hannam disponibiliza também um excelente resumo da Renascimento do Século 12 que, contrariando a percepção popular e contrariando "o Mito", foi efectivamente o período durante o qual o conhecimento antigo invadiu a Europa Ocidental. Longe de ter sido resistido pela Igreja, foram os homens da Igreja que buscaram este conhecimento junto dos muçulmanos e das Judeus da Espanha e da Sicília.
E longe de ter sido resistido e banido pela Igreja, o conhecimento foi absorvido e usado para formar a base do programa de estudo dessa outra grande contribuição Medieval para o mundo: as universidades que começavam a aparecer um pouco por todo o mundo Cristão.
Deus e a Razão
Deus_Razao_Ciencia_Idade_MediaO encapsulamento da razão no centro da pesquisa, combinada com o influxo do "novo" conhecimento Grego e Árabe, deu início a uma autêntica explosão de actividade intelectual na Europa, começando no Século 12 e avançando por aí em adiante. Foi como se o estímulo súbito de novas perspectivas e as novas formas de olhar para o mundo tenham caído em terreno fértil numa Europa que, pela primeira vez em séculos, encontrava-se em paz  relativa, era próspera, olhava para o exterior, e era genuinamente curiosa.
Isto não significa que as forças mais conservadoras e reaccionárias não tenham tido dúvidas em relação às novas áreas de pesquisa, especialmente em relação à forma como a filosofia e a especulação em torno do mundo natural e em torno do cosmos poderia afectar a teologia aceite. Hannam é cuidadoso para não fingir que não houve qualquer tipo de resistência ao florescimento do novo pensamento e da investigação, mas, ao contrário dos perpetuadores "do Mito", ele leva em consideração essa resistência mas não a apresenta como tudo o que há para saber sobre esse período.
De facto, os esforços dos conservadores e dos reaccionários eram normalmente acções de retaguarda e foram em quase todas as instâncias infrutíferas nas suas tentativas de  limitar a inevitável inundação de ideias que começou a jorrar das universidades. Mal ela começou, ela foi literalmente imparável.
De facto, alguns dos esforços dos teólogos de colocar alguns limites ao que poderia e não poderia ser aceite através do "novo conhecimento", geraram como consequência o estímulo da investigação, e não a sua constrição.
As "Condenações de 1277" tentaram afirmar algumas coisas que não poderiam ser declaradas como "filosoficamente verdadeiras", particularmente aquelas coisas que colocavam limites à Omnipotência Divina. Isto teve o interessante efeito de mostrar que Aristóteles havia, de facto feito alguns erros graves - algo que Tomás de Aquinas havia colocado ênfase na sua altamente influente Summa Theologiae:
As condenações e a Summa Theologiae de Aquinas haviam gerado um enquadramento dentro do qual os filósofos naturais poderiam prosseguir os seus estudos em segurança, e esse enquadramento havia estabelecido o princípio de que Deus havia decretado as leis naturais mas que Ele não Se encontrava limitado pelas mesmas. Finalmente, esse enquadramento declarou que Aristóteles esteve por vezes errado. O mundo não era "eterno segundo a razão" e "finito segundo a fé". O mundo não era eterno. Ponto final.
E se Aristóteles poderia estar errado em algo que ele considerava certamente certo, isso colocava em dúvida toda a sua filosofia. Estava assim aberto o caminho para que os filósofos naturais da Idade Média avançassem de forma mais firme para além das façanhas dos Gregos. (Hannam, pp 104-105)
E foi exactamente isso que eles passaram a fazer. Longe de ser uma era sombria e estagnada, tal como o foi a primeira metade do Período Medieval (500-1000), o periodo que vai desde o ano 1000 até ao ano 1500 é, na verdade, o mais impressionante florescimento da pesquisa e da investigação científica desde o tempo dos antigos Gregos, deixando muito para trás as Eras Helénicas e Romanas em todos os aspectos.
Com Occam e Duns Scotus a avançarem com a abordagem crítica aos trabalhos de Aristóteles para além da abordagem mais cautelosa de Aquinas, estava aberto o caminho para que os cientistas Medievais dos Séculos 14 e 15 questionassem, examinassem e testassem as perspectivas que os tradutores dos Séculos 12 e 13 lhes haviam dado, e isto com efeitos surpreendentes:
Durante o século 14, os pensadores medievais começaram a reparar que havia algo seriamente errado em todos os aspectos da filosofia Natural de Aristóteles, e não só naqueles aspectos que contradiziam directamente a Fé Cristã. Havia chegado o momento em que os estudiosos medievais seriam capazes de começar a sua busca como forma de avançar o conhecimento......enveredando por novas direcções que nem os Gregos e nem os Árabes haviam explorado. O seu primeiro avanço foi o de combinar as duas disciplinas da matemática e da físicas duma forma que não havia sido feita no passado. (Hannam p. 174)
A história deste avanço, e os espantosos estudiosos de Oxford que o levaram a cabo e, desde logo, lançaram as bases da ciência genuína - os "Calculadores de Merton" - muito provavelmente merece um livro separado, mas o relato de Hannam certamente que lhes faz justiça e é uma secção fascinante da sua obra.
Os nomes destes pioneiros do método científico - Thomas BradwardineWilliam HeytesburyJohn Dumbleton e o deliciosamente nomeado Richard Swineshead - merecem ser conhecidos. Infelizmente, a obscurecedora sombra "do Mito" significa que eles continuam a ser ignorados ou desvalorizados até mesmo em histórias da ciência recentes e populares. O resumo de Bradwardine do discernimento-chave que estes homens trouxeram para a ciência é uma das citações mais importantes da ciência inicial e ela merece ser reconhecida como tal:
[A matemática] é a reveladora da verdade genuína.....quem quer que tenha o descaramento de estudar a física ao mesmo tempo que negligencia a matemática, tem que saber desde o princípio que nunca entrará pelos portais da sabedoria. (Citado por Hannam, p. 176)
Estes homens não só foram os primeiros a aplicar de forma genuína a matemática à física, como desenvolveram funções logarítmicas 300 anos antes de John Napier, e o Teorema da Velocidade Média 200 anos antes de Galileu. O facto de Napier e Galileu serem creditados por terem descoberto coisas que os estudiosos Medievais já haviam desenvolvido é mais um indicador da forma como "o Mito" tem distorcido a nossa percepção da história da ciência.
Nicolas_OresmeSemelhantemente, a física e a astronomia de Jean Buridan e de Nicholas Oresme eram radicais e profundas, mas de modo geral, desconhecidas para o leitor comum.  Buridan foi um dos primeiros a comparar os movimentos do cosmos com os movimentos daquela que é outra inovação Medieval: o relógio. A imagem dum universo a operar como um relógio, imagem essa que passou a ser usada com sucesso pelos cientistas até aos dias de hoje, começou na Idade Média.
E as especulações de Oresme em relação a uma Terra em rotação mostra que os estudiosos Medievais alegremente contemplavam ideias que (para eles) eram razoalmente estranhas como forma de ver se funcionariam; Oresme descobriu que esta ideia em especial na verdade funcionava muito bem.
Dificilmente estes homens eram o resultado duma "idade das trevas" e as suas carreiras estão conspicuamente livres de qualquer tipo de Inquisidores e de ameaças de queimas tão amadas e sinistramente imaginadas pelos fervorosos proponentes "do Mito".
Galileu, Inevitavelmente.
Tal como dito em cima, nenhuma manifestação "do Mito" está completa se que o Incidente de Galileu seja mencionado. Os proponentes da ideia de que durante a Idade Média a Igreja sufocou a ciência e a racionalidade têm que empurrá-lo para a linha da frente visto que, sem ele, eles não têm exemplos da Igreja a perseguir alguém por motivos relacionados à pesquisa do mundo natural.
A ideia comum de que Galileu foi perseguido por estar certo em relação ao heliocentrismo é uma total simplificação dum assunto complexo, e um que ignora o facto do principal problema de Galileu não ser só que as suas ideias estavam em desacordo com a interpretação das Escrituras, mas também em desacordo com a ciência dos seus dias.
Ao contrário da forma como este assunto é normalmente caracterizado, nos dias de Galileu o ponto principal era o facto das objecções científicas ao heliocentrismo ainda serem suficientemente poderosas para impedirem a sua aceitação.
Em 1616 o Cardeal Bellarmine deixou bem claro para Galileu que se aquelas objecções científicas pudessem ser superadas, então as Escrituras poderiam e deveriam ser reinterpretadas. Mas enquanto essas objecções se mantivessem, a Igreja, compreensivelmente, dificilmente iria derrubar séculos de exegese em favor duma teoria errónea. Galileu concordou em só ensinar o heliocentrismo como um dispositivo de cálculo teórico, mas depois mudou de ideia e, num estilo típico, ensinou-a como um facto. Isto causou a que em 1633 ele fosse acusado pela Inquisição.
Hannam disponibiliza o contexto para tudo isto com detalhe adequado numa secção do livro que também explica a forma como o Humanismo do "Renascimento" causou a que uma nova vaga de estudiosos não só tenha buscado formas de idolatrar os antigos, mas também formas de voltar as costas às façanhas de estudiosos mais recentes tais como Duns Scotus, Bardwardine, Buridan, e Orseme.
Consequentemente, muitas das suas descobertas e muitos dos seus avanços ou foram ignorados, ou foram esquecidos (só para serem redescobertos independentemente), ou foram desprezados mas silenciosamente apropriados. O caso de Galileu usar o trabalho dos estudiosos Medievais sem reconhecimento é suficientemente condenador.
Na sua ânsia de rejeitar a "dialéctica" Medieval e emular os Gregos e os Romanos - que, curiosamente, e de muitas formas, fez do "Renascimento" um movimento conservador e retrógrado - eles rejeitaram desenvolvimentos e avanços genuínos dos estudiosos Medievais. Que um pensador do calibre Duns Scotus se tenha tornado primordialmente conhecido como a etimologia da palavra "dunce" é profundamente irónico.
Por melhor que seja a parte final do livro, e por mais valiosa que seja a análise razoavelmente detalhada das realidades em torno do Incidente de Galileu, tenho que dizer que os últimos 4 ou 5 capítulos do livro de Hannam passam a ideia de terem falado de coisas que eram demasiado complicadas de se "digerir". Eu fui capaz de seguir o seu argumento facilmente, mas eu estou bem familiarizado com o material e com o argumento que ele está a avançar.
Acredito que para aqueles com esta ideia do "Renascimento", e para aqueles com a ideia de que Galileu nada mais era que um mártir perseguido da ciência e um génio, a parte final do livro pode avançar duma forma demasiado rápida para eles entenderem. Afinal de contas, os mitos têm uma inércia muito pesada.
Pelo menos uma pessoa que reviu o livro parece ter achado o peso dessa inércia demasiado dura para resistir, embora seja provável que ela tenha a sua própria bagagem para carregar. Nina Powerescrevendo para a revista New Humanist, certamente que parece ter tido alguns problemas em deixar de parte a ideia da Igreja a perseguir os cientistas Medievais:
Só porque a perseguição não era tão má como poderia ter sido, e só porque alguns pensadores não eram as pessoas mais simpáticas do mundo, isso não significa que interferir no seu trabalho ou banir os seus livros era justificável nessa altura ou que seja justificável nos dias de hoje.
Bem, ninguém disse que era justificável; explicar como é que ela surgiu, e o porquê dela não ter sido tão extensa como as pessoas pensam, e como ela não teve a natureza que as pessoas pensam que teve, não é "justificar" nada, mas sim corrigir um mal-entendido pseudo-histórico.
Dito isto, Power tem algo que parece ser a razão quando salienta que "A caracterização de Hannam dos pensadores [do Renascimento] como 'reaccionários incorrigíveis' que 'quase conseguiram destruir 300 anos de progresso na filosofia natural' está em oposição com a sua caracterização mais cuidada daqueles que vieram antes." No entanto, isto não é porque a caracterização está errada, mas sim porque a dimensão e a extensão do livro realmente não lhe dão espaço para fazer justiça a esta ideia razoavelmente complexa, e, para muitos, radical. (...)
Deixando isso de parte, este é um livro maravilhoso, e um antídoto acessível e brilhante contra "o Mito". Ele deveria estar na lista de Natal de qualquer Medievalista, estudioso da história da ciência, ou de qualquer pessoa que tem um amigo equivocado que ainda pensa que as luzes da Idade Média eram acesas queimando cientistas.